Por que falta água na Cantareira
ECONOMIA & NEGÓCIOS
04 Fevereiro 2015 | 11:58
É
necessário recuperar a vegetação nas áreas de nascentes e cursos d’água
ao invés de apenas fazer obras de engenharia, defendem os especialistas
Eduardo Assad e Roberto Rodrigues
Eduardo Assad e Roberto Rodrigues*
Em
meio a tantas notícias ruins, como queda da Bolsa, falta de água, falta
de luz, eis que das montanhas de Minas Gerias surgem notícias
razoavelmente boas. A água voltou a brotar nas nascentes no alto da
serra da Mantiqueira, nos municípios que alimentam o rio Jaguari,
principal fornecedor de água para a Cantareira.
O
problema é que ainda não tem volume nem força para percorrer 100
quilômetros e encher os reservatórios do Sistema Cantareira em Bragança
Paulista e Joanópolis, em São Paulo. Mas é a natureza nos indicando que
se preservarmos ela reage.
Nos
últimos 500 anos desmatamos as nascentes e as áreas ao longo dos rios
que nos abastecem de água. No passado, Minas Gerais e São Paulo brigaram
por causa do ouro: foram guerras localizadas e sangrentas, todas para
atender a corte. Hoje o ouro é a água. E vindo também de Minas Gerais,
de Munícipios que adotam políticas de preservação dos seus rios, como o
município de Extrema. Não poderia ser diferente: preservou, choveu e a água brotou.
Mas, por que não brota nos outros oito municípios paulistas que compõem a região da Cantareira?
A
resposta é Simples. O desmatamento no passado foi muito grande.
Enquanto nos preocupávamos, com razão, com os impactos do desmatamento
na Amazônia, nos esquecemos de cuidar do quintal de casa.
Permitimos
a expansão urbana desenfreada, impermeabilizamos os solos, cortamos as
árvores e reduzimos a infiltração da água que alimenta o lençol
freático.
Aumentou
a erosão e as enchentes se multiplicaram. As mudanças climáticas
explicam em parte a maior frequência de ocorrência de chuvas intensas
nos últimos anos.
Mas
o maior o problema foi a redução dramática da vegetação em torno das
nascentes e dos cursos d´água. Nos 12 municípios que estão em volta da
Cantareira, quatro estão em Minas Gerais e oito em São Paulo: Itapeva,
Camanducaia, Sapucaí-Mirim e Extrema em Minas Gerais e Bragança
Paulista, Vargem, Joanópolis, Piracaia, Nazaré Paulista, Mairiporã,
Franco da Rocha e Caieiras, em São Paulo.
Em
todos eles a situação é alarmante. Estudos da Embrapa com a Fundação
Getúlio Vargas indicam que são mais de 8.100 km de rios e córregos com
menos de 10 metros de largura não protegidos, em 34 mil hectares
desmatados.
Existem
diversos exemplos no Brasil mostrando que a simples revegetação promove
a volta da água. Para iniciar essa recuperação na Cantareira serão
necessárias milhões de mudas de espécies nativas da Mata Atlântica.
Muitas são conhecidas e bem estudadas. E
em São Paulo estão as maiores empresas capazes de indicar as espécies e
produzi-las. Pena que nada foi feito. Enquanto isso, só se fala em
buscar água daqui e de acolá, e em obras de engenharia.
Nova
York passou por problemas parecidos. Preservou as nascentes na áreas
mais altas e revegetou as áreas de preservação permanente. Atuou
diretamente naquilo que é conhecido como segurança hídrica, que é manter
o ciclo hidrológico funcionando, preservando as funções hídricas da
biodiversidade.
Em
17 de março de 1537, Duarte Coelho, Governador de Pernambuco, enviou
requerimento à câmara de vereadores de Olinda, proibindo o corte de
todas as madeiras ao redor dos ribeiros e das fontes sob pena posta em
regimento. Também proibiu que os colonos jogassem lixo nos rios e nas
aguadas. Temos história! Acorda Brasil! Acorda São Paulo!
* Pesquisador da Embrapa e Pesquisador Visitante da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas
**
Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, Embaixador Especial da FAO
para as Cooperativas e Presidente da Academia Nacional de Agricultura
SNA e ex-ministro da Agricultura
Fonte: http://economia.estadao.com.br/blogs/retratos-da-economia/por-que-falta-agua-na-cantareira/
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